“Quem ouve a minha palavra, e crê naquele que me enviou, tem a vida eterna”: como entender essa declaração de Jesus? Será que devemos compreendê-la ao pé da letra? Mas, neste caso, temos que nos perguntar o que seja a vida eterna. Os que acreditam no inferno, na condenação eterna, acreditam na vida eterna, pois a condenação eterna não deixa de ser uma espécie de vida. Além disso, dois terços da humanidade é composta por não-cristãos, pessoas de outras religiões, que nunca tiveram e talvez jamais tenham contato com a “palavra de Jesus”. Será que eles não terão a tão falada vida eterna?
Não podemos compreender os Evangelhos ao pé da letra. Neste vídeo, o 11º da série de estudos sobre o Evangelho de João, tratamos destes e de outros temas, numa visão enriquecida pelo conhecimento espírita.
Abaixo você pode ler todo o texto do vídeo.
JOÃO 5:17-47
- E Jesus lhes respondeu: Meu Pai trabalha até agora, e eu trabalho também.
- Por isso, pois, os judeus ainda mais procuravam matá-lo, porque não só quebrantava o sábado, mas também dizia que Deus era seu próprio Pai, fazendo-se igual a Deus.
A expressão “filho de Deus” era usada normalmente, mas os judeus consideravam Deus como absolutamente transcendente, exterior. Jesus vem nos ensinar que somos filhos de Deus no sentido de “frutos de Deus”, produtos de Deus participantes da sua natureza divina. Isso a maior parte dos cristãos não compreendeu até agora, embora o texto fale por si mesmo. Mil e quinhentos anos de dogmas e bibliolatria condicionaram as suas mentes.
- Mas Jesus respondeu, e disse-lhes: Na verdade, na verdade vos digo que o Filho por si mesmo não pode fazer coisa alguma, se o não vir fazer o Pai; porque tudo quanto ele faz, o Filho o faz igualmente.
- Porque o Pai ama o Filho, e mostra-lhe tudo o que faz; e ele lhe mostrará maiores obras do que estas, para que vos maravilheis.
“(…) o Filho por si mesmo não pode fazer coisa alguma (…)” – é isso que Jesus nos ensina na parábola do servo inútil, em Lucas 17:7-10.
Todo o mal que fazemos é fruto da nossa ignorância, é oposição a Deus. A palavra “diabo” quer dizer “opositor” – somos diabólicos sempre que andamos na contramão de Deus.
Todo o bem que fazemos não é mérito nosso, é Deus manifestando-se através de nós. Quando plantamos uma flor ou quando uma criança sorri para alguém, isso é manifestação de Deus em nós.
“(…) ele lhe mostrará maiores obras do que estas, para que vos maravilheis” – quando Jesus disse essas palavras, nenhum daqueles homens imaginava que um dia chegaríamos onde chegamos. As obras de Deus são manifestadas cada vez mais intensamente com as descobertas da ciência, com a tecnologia, com a percepção que nós temos hoje do espaço infinito.
No tempo de Jesus pensavam que o mundo girava em torno da Terra – que o Sol, a Lua e as estrelas cumpriam papeis em função da Terra.
- Pois, assim como o Pai ressuscita os mortos, e os vivifica, assim também o Filho vivifica aqueles que quer.
O Pai ressuscita os mortos – o verbo traduzido como “ressuscita” é egeire (εγειρε), o mesmo verbo que Jesus disse ao homem no tanque: “levante-te”. O pai levanta os mortos. Isso tanto se refere aos que desencarnam e voltam para o plano astral, quanto para os que fazem o caminho inverso, ou seja, reencarnam.
E se refere também aos espiritualmente mortos, que é o caso aqui. O contexto é o homem enfermo que foi curado. Este homem não estava fisicamente morto, mas estava espiritualmente morto, e levantou da morte para a vida.
“Vivifica” é a tradução de zoopoiei (ζωοποιει), que literalmente quer dizer “faz viver” ou “produz vida” – quando fazemos a vontade de Deus nós somos co-creadores com Deus. Produzimos vida onde não havia vida, mas isso não é mérito nosso: somos apenas instrumentos de Deus, o Senhor da Vida.
- E também o Pai a ninguém julga, mas deu ao Filho todo o juízo;
Essa passagem não tem nada a ver com “julgamento”. O verbo “julga” é aqui uma má tradução do verbo grego krino (κρινω), que quer dizer “separar”, “escolher”, “distinguir”. Da raiz deste verbo derivam as palavras “critério” e “crivo”, quando nós falamos em “usar o crivo da razão”. Esse julgamento, então, é uma seleção natural baseada no critério da Lei de causa e efeito: a cada um segundo as suas obras (Mateus 16:17).
Da maneira como está traduzido, a contradição é gritante, pois aqui diz que o Pai deu todo juízo ao filho, mas em 3:17 é dito que “Deus enviou o seu Filho ao mundo, não para que condenasse o mundo, mas para que o mundo fosse salvo por ele”; e em 12:47 Jesus diz: “eu vim, não para julgar o mundo, mas para salvar o mundo”.
O caráter dessa escolha, dessa separação, dessa distinção natural é explicado em 3:36:
“Aquele que crê no Filho tem a vida eterna; mas aquele que não crê no Filho não verá a vida, mas a ira de Deus sobre ele permanece” – aquele que é fiel às Leis de Deus que estão gravadas em nossa consciência tem a vida plena, vive em Deus; mas aquele que desobedece às Leis de Deus não verá a vida, mas a ira de Deus permanece sobre ele. Lembramos que a palavra grega traduzida como ira é orge (οργη), que significa uma agitação interior que expande a alma. É uma inquietação, uma permanente insatisfação íntima. A nossa consciência, que é onde estão gravadas as Leis de Deus, fica num estado de permanente agitação, inquietação, por estar desobedecendo aquilo que ela sabe ser correto.
Se trocarmos o verbo “julga” pelo verbo “escolhe”, o entendimento fica mais fácil: “o Pai não escolhe ninguém, mas deu toda escolha ao filho” – Deus ao crear o Universo creou as Suas Leis, perfeitas e imutáveis. Deus não escolhe ninguém, todos estão submetidos à mesma Lei, que é única. Mas Deus deu toda a escolha ao filho. O filho do Pai somos nós – nós não dizemos “Pai nosso que estás nós céus”? E nós recebemos do Pai toda escolha – a capacidade de escolha, o livre-arbítrio.
- Para que todos honrem o Filho, como honram o Pai. Quem não honra o Filho, não honra o Pai que o enviou.
Todos somos filhos. Jesus nos representa a todos como um irmão mais velho e incalculavelmente mais experiente. Mas todos somos filhos. Temos que honrar-nos uns aos outros. Se não nos honrar-nos uns aos outros não há como honrar a Deus.
- Na verdade, na verdade vos digo que quem ouve a minha palavra, e crê naquele que me enviou, tem a vida eterna, e não entrará em condenação, mas passou da morte para a vida.
- Em verdade, em verdade vos digo que vem a hora, e agora é, em que os mortos ouvirão a voz do Filho de Deus, e os que a ouvirem viverão.
“(…) quem ouve a minha palavra (…)” – palavra é a tradução de logos. Este Evangelho começa dizendo: “No princípio era o logos” – quase sempre traduzido como “verbo”, mas a palavra é logos.
Jesus diz aqui: “quem ouve a minha palavra”, ou melhor, quem ouve o meu “Logos” – ouvir é estar receptivo, é deixar-se penetrar pelo som. Quem é receptivo ao Logos (que se manifesta plenamente em Jesus) e quem é fiel a Deus, quem vive em harmonia com Deus, tem a vida eterna. Vida eterna, como vimos, é uma qualidade de vida, não é viver para sempre.
Quem ouve o Logos não passará da morte para a vida por seleção, não passará por um crivo. Ele já foi automaticamente transladado da morte espiritual para a vida plena.
“(…) vem a hora, e agora é (…)” – na verdade vem “uma” hora, pois não há artigo definindo a hora. Vem uma hora – que é diferente para todos, pois cada um tem o seu tempo, mas esse tempo está subordinado à nossa vontade, por isso Jesus diz: “agora é”.
No meio espírita é comum dizer que cada um tem o seu tempo. É claro que todos estão em estágios evolutivos ligeiramente diferentes. Mas isso é muitas vezes usado como desculpa para as suas fraquezas de caráter. Quem decide quando é a hora somos nós. Alguns têm mais preparo, outros menos, mas não podemos nos apoiar em muletas desculpistas e adiar indefinidamente a nossa evolução.
- Porque, como o Pai tem a vida em si mesmo, assim deu também ao Filho ter a vida em si mesmo;
- E deu-lhe o poder de exercer o juízo, porque é o Filho do homem.
“(…) ter a vida em si mesmo” – somos imortais, temos vida para sempre, e temos a vida plena em Deus (chamada neste Evangelho de “vida eterna”) dentro de nós, em nosso íntimo, competindo a nós mesmos o seu desvelamento.
O “poder de exercer o juízo” é melhor traduzido como o “poder de fazer escolhas” – o livre-arbítrio.
A expressão “filho do homem” aqui não tem o mesmo sentido que encontramos nos Evangelhos sinóticos. Nos Evangelhos sinóticos o filho do homem (embora algumas vezes se refira diretamente a Jesus) designa o homem no seu próximo estágio evolutivo, o homem em que já predomina o espírito sobre a matéria.
A expressão “filho de” é um hebraísmo que designa a qualidade da palavra que segue a essa expressão. “Filho do homem”, aqui, é o “resultado do homem” – fruto do homem.
A palavra traduzida como “poder” é exousia (εξουσια), que é o poder concedido, a delegação de poder. Deus delega o poder de acordo com o nível de adiantamento espiritual de cada um. Quanto mais adiantado, maior é o grau de liberdade do espírito.
A melhor tradução então é: “Deus lhe concedeu o poder de fazer escolhas, porque o poder de escolha é resultado da natureza humana”.
- Não vos maravilheis disto; porque vem a hora em que todos os que estão nos sepulcros ouvirão a sua voz.
Não podemos pensar que Jesus esteja se referindo, aqui, aos mortos levantarem do túmulo, como num filme de terror. Toda a referência é aos espiritualmente mortos.
Se levarmos esta afirmação ao pé da letra, porque ele fala em sepulcro, temos que levar ao pé da letra também o resto: temos que imaginar o filho de Deus explodindo os seus pulmões de tanto gritar e os mortos ouvindo, nos cemitérios, e levantando.
Noutra ocasião Jesus diz: “deixa aos mortos o enterrar os seus mortos” (Lucas 9:60) – é claro que ele não está se referindo a um defunto enterrar outro defunto, ele fala dos espiritualmente mortos.
“Sepulcro” é a tradução da palavra grega mnémeion (μνημειον), que quer dizer “memorial”. Cada espírito é um memorial de Deus, é um lembrete de que existe Deus. Só que muitos estão esquecidos da sua verdadeira natureza. Mas Jesus diz que vem a hora em que todos ouvirão a voz do filho de Deus, ou seja, todos serão receptivos ao seu Cristo interno, ouvirão a voz do Cristo lhes chamando.
- E os que fizeram o bem sairão para a ressurreição da vida; e os que fizeram o mal para a ressurreição da condenação.
“Ressurreição da condenação” é uma péssima tradução. Aqui a palavra traduzida como “ressurreição” não é egeiró (εγειρω). A palavra grega é anastasis (αναστασις), formada pelo prefixo ana, que quer dizer “de novo”, “novamente”, e hístemi, que se refere a estado; “ficar de pé”, “firme”, “estabelecido”. Anastasis é voltar ao seu estado anterior, ou seja, “restaurar”.
Os que estavam espiritualmente mortos ouviram a voz do Cristo e saíram para a restauração da vida, da vida em Deus, da vida plena. “Mal” é aqui a tradução de phaulos (φαυλος). Phaulos quer dizer coisa “vulgar”, “sem valor”, “sem importância”, não necessariamente o mal – os que praticaram coisas vulgares ligadas apenas a questões materiais, saíram para a restauração da escolha, ou seja, a possibilidade de fazer novas escolhas depois de ter ficado parcialmente presos ao resultado de suas escolhas equivocadas do passado.
- Eu não posso de mim mesmo fazer coisa alguma. Como ouço, assim julgo; e o meu juízo é justo, porque não busco a minha vontade, mas a vontade do Pai que me enviou.
“(…) como ouço, assim julgo (…)” – ouvir é estar receptivo. Jesus é pura manifestação de Deus. Conforme recebe de Deus, conforme Deus o preenche, assim ele escolhe. Escolhe, não julga: “a minha escolha é justa porque não busco a minha vontade, mas a vontade do Pai que me enviou”.
- Se eu testifico de mim mesmo, o meu testemunho não é verdadeiro.
Isso só pode ser uma pergunta. Os manuscritos não tinham sinais de pontuação, então aqui se trata de uma pergunta: “Se eu testifico de mim mesmo, o meu testemunho não é verdadeiro?”
Jesus está fazendo uma pergunta. Se ele estivesse afirmando isso, estaria se contradizendo, pois em 8:13,14,18 ele afirma o contrário:
“Disseram-lhe, pois, os fariseus: Tu testificas de ti mesmo; o teu testemunho não é verdadeiro. Respondeu Jesus, e disse-lhes: Ainda que eu testifico de mim mesmo, o meu testemunho é verdadeiro, porque sei de onde vim, e para onde vou; mas vós não sabeis de onde venho, nem para onde vou”.
“Eu sou o que testifico de mim mesmo, e de mim testifica também o Pai que me enviou”.
Jesus continua dizendo a mesma coisa assinalada nestes versículos:
- Há outro que testifica de mim, e sei que o testemunho que ele dá de mim é verdadeiro.
Ele está se referindo ao testemunho do Pai. A própria manifestação de Deus através de Jesus é o testemunho de Deus.
- Vós mandastes mensageiros a João, e ele deu testemunho da verdade.
Vimos que os fariseus mandaram inquirir João em 1:19-28. Se mandaram inquirir João, é porque davam importância a ele, logo, deveriam aceitar o seu testemunho.
Embora seja Jesus quem esteja falando, não se trata apenas do testemunho de Jesus, do homem Jesus. Jesus está falando do Cristo, a manifestação de Deus em nós.
- Eu, porém, não recebo testemunho de homem; mas digo isto, para que vos salveis.
“Salvar” não é ir para o céu – salvar é livrar dos perigos, conservar com saúde, proteger.
- Ele era a candeia que ardia e alumiava, e vós quisestes alegrar-vos por um pouco de tempo com a sua luz.
João, nesta época, estava preso por ordem de Herodes, e logo seria executado. “Ele era a candeia” – candeia era a lâmpada da época. Vimos em 3:29 que João se comparou com o amigo do noivo. Uma das funções do amigo do noivo (uma espécie de padrinho de casamento) era iluminar o caminho do noivo com uma lâmpada. João foi o precursor de Jesus, e iluminou o caminho de Jesus até Jesus iniciar a sua missão. João fez muito sucesso, chamou a atenção de muita gente.
- Mas eu tenho maior testemunho do que o de João; porque as obras que o Pai me deu para realizar, as mesmas obras que eu faço, testificam de mim, que o Pai me enviou.
Aqui qualquer pessoa de bom senso há de reconhecer que Jesus não está se referindo a ele mesmo – Jesus está se referindo ao Cristo, que é Deus em nós. Se estivesse falando de si como homem, a que obras estaria se referindo? Às curas que ele promoveu? Todos os dias alguém é curado através de outro alguém por um meio aparentemente inexplicável. Inúmeras pessoas se notabilizaram por promover curas. Faça uma pesquisa no Google agora mesmo e você vai ver que há pessoas curando no Brasil. Não pode ser a estas obras que Jesus se refere. Ou foi transformar água em vinho? Já estudamos essa grandiosa lição de Jesus – grandiosa como lição, mas que valor prático teria isso para nós?
As obras que o Cristo faz estão visíveis em todo o Universo. O Cristo ou Logos ou Verbo ou o Filho é Deus manifestado, é a manifestação de Deus no mundo sensível, é o princípio ordenador do mundo.
Se Jesus estivesse falando de si mesmo como ser, como pessoa, isso seria até feio: “eu tenho maior testemunho do que o de João” – imagine se nós vamos dar uma palestra e nos referimos ao palestrante anterior: – “esse outro palestrante alegrou vocês um pouco, mas a minha palestra é a maior”.
Os discursos de Jesus, tão presentes no Evangelho de João, são em nome do Cristo. O que ele diz dele é válido potencialmente para todos nós, para toda a humanidade.
- E o Pai, que me enviou, ele mesmo testificou de mim. Vós nunca ouvistes a sua voz, nem vistes o seu parecer.
“(…) nunca ouvistes a sua voz (…)” – as Leis de Deus estão gravadas em nossa consciência. Ouvir a voz de Deus é ouvir a voz da consciência.
“(…) nem vistes o seu parecer” – os que não ouvem a voz da consciência não percebem a forma de Deus na creação.
- E a sua palavra não permanece em vós, porque naquele que ele enviou não credes vós.
“(…) a sua palavra não permanece em vós (…)” – o Logos de Deus não permanece neles. Por quê? Porque “(…) naquele que ele enviou não credes vós” – já vimos que não se trata de “crer”, mas de aderir, entrar em harmonia, sintonizar. Nossa mente é emissora e receptora de pensamentos, sentimentos e energias. Quando sintonizamos com Jesus entramos em harmonia com Deus.
- Examinais as Escrituras, porque vós cuidais ter nelas a vida eterna, e são elas que de mim testificam;
Jesus os está acusando de pensarem que a vida eterna está nas escrituras – isso é assim até hoje! O que os fundamentalistas fazem senão adorar um livro? Muitos ainda pensam que a salvação está num livro velho fedendo a sovaco.
A palavra traduzida como cuidais é dokeite (δοκειτε) – indicativo presente na voz ativa, segunda pessoa do plural do verbo dokeó (δοκεω), que tem como substantivo doxa (δοξα), que é quase sempre traduzido como “glória”.
Vemos que aqui dokeó se refere a opinião: “vós cuidais ter nas escrituras a vida eterna” – vós “sois de opinião” de que tendes nas escrituras a vida eterna.
“(…) são elas (as escrituras) que de mim testificam (…)”
- E não quereis vir a mim para terdes vida.
As escrituras não oferecem a vida eterna, mas testificam da vida eterna (ou vida plena) que está no Cristo.
- Eu não recebo glória dos homens;
Veja a contradição: se doxa aqui deve ser traduzido como “glória”, e se Jesus é Deus, como muitos pensam, dizer “glória a Deus” é desobedecer a Jesus. Quando um crente diz “glória a Deus!” ele estaria desobedecendo Jesus, porque, para ele, Jesus é Deus – e Jesus diz aqui que não recebe glória dos homens.
A tradução aqui, como em muitas outras vezes, não é “glória”. Agora há pouco Jesus falou de “opinião”, dizendo: “vós sois de opinião de que tendes nas escrituras a vida eterna”. Agora ele está dizendo: “eu não aceito opinião dos homens”.
O verbo lambanó (λαμβανω) pode ser traduzido como “recebo” ou “aceito”. Jesus não aceita opinião dos homens, pois ele é um espírito plenamente cristificado, só se importa com a opinião de Deus.
- Mas bem vos conheço, que não tendes em vós o amor de Deus.
- Eu vim em nome de meu Pai, e não me aceitais; se outro vier em seu próprio nome, a esse aceitareis.
- Como podeis vós crer, recebendo honra uns dos outros, e não buscando a honra que vem só de Deus?
“(…) recebendo honra uns dos outros (…)” – aqui parece que Jesus está criticando a honra. Em 5:23 Jesus diz:
“Para que todos honrem o Filho, como honram o Pai. Quem não honra o Filho, não honra o Pai que o enviou” – e nós comentamos que “todos somos filhos. Temos que honrar-nos uns aos outros. Se não nos honrar-nos uns aos outros não há como honrar a Deus”. Será que o que nós dissemos é contrário ao que Jesus está dizendo agora?
Não. Em 5:23 a palavra traduzida como honra é timé (τιμη), que quer dizer exatamente “honra”, “preço”. Aqui no versículo 44 não se trata de timé, mas de… doxa – a mesma palavra que gostam de traduzir como “glória”, e que, tanto aqui como no versículo 41, se refere a “opinião”.
No versículo 41 Jesus disse que “não aceita a opinião dos homens”. Agora ele está dizendo: “como podeis vós crer, aceitando a opinião uns dos outros, e não procurais a opinião que vem do único Deus?”
- Não cuideis que eu vos hei de acusar para com o Pai. Há um que vos acusa, Moisés, em quem vós esperais.
Novamente a palavra doxa: “Não cuideis”. Na verdade, não “opineis”, não “formeis a opinião”.
- Porque, se vós crêsseis em Moisés, creríeis em mim; porque de mim escreveu ele.
Eles adoravam um livro, mas não compreenderam o que o livro tinha para lhes dizer.
- Mas, se não credes nos seus escritos, como crereis nas minhas palavras?
Certamente não acreditariam nas palavras faladas por Jesus – se não estão escritas, como acreditar? Ou, mesmo que estivessem escritas, mas se não estavam escritas ao pé da letra, como acreditar?
Essa abordagem de Jesus é muito atual. A bibliolatria está maior do que nunca. Podemos falar a respeito do que está escrito, de acordo com os conhecimentos de que dispomos hoje – mas, se não está escrito…
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