Artigo publicado originalmente em 24/05/2012
Pouco tempo atrás, eu era um homem forte, sábio, quase onipotente. Eu sabia coisas importantíssimas; na verdade eu era o homem que sabia tudo. Perguntavam, eu respondia. Respondia com segurança, sabia o que estava dizendo. Às vezes com um sorriso nos lábios, alegre com minha própria sabedoria; às vezes impaciente, aborrecido por ter que responder indagações tão óbvias e pueris!
Pouco tempo atrás eu era forte como um touro; levantava pessoas acima da minha cabeça, sem esforço, até duas de uma vez. Era um atleta, mas não um atleta comum, eu não era comum em nada, em tudo eu era o melhor, o máximo. Só não era perfeito porque às vezes impunha minha força, meu poder, e sabia ser cruel…
Pouco tempo atrás eu era um ser inalcançável, incompreensível em minha magnitude e sapiência. Fazia coisas misteriosas e ininteligíveis, e para isso me ausentava por muito, muito tempo. E o mais estranho era que eu, com todo o meu poder, fazia isso sempre, e contra a vontade, pois reclamava muito…
Pouco tempo atrás eu já era pai, e meus filhos já eram filhos, mas eram crianças, apenas crianças, nada mais que crianças; inocentes, sonhadoras, ingênuas! E para eles eu era tudo isso, um herói, pois era o que eles não eram; era “grande”.
Continuo grande, então o que mudou? Você sabe, eles cresceram. Eles crescem. E rápido. E, quando crescem, descobrem nossa verdadeira identidade, descobrem quem nós somos de verdade, descobrem que somos apenas adultos. Só isso. Pessoas que cresceram há mais tempo. Simples assim. Continuamos sabendo coisas, mas já não temos respostas para tudo; aliás, temos muitas perguntas, poucas respostas. Continuamos sendo fortes, mas não tão fortes, nem atletas; na verdade apenas saudáveis. Continuamos nos ausentando muito, mas há muito eles sabem que isso se chama trabalho, é uma coisa comum, todos fazem, não há nada de extraordinário ou misterioso.
Sim, eles crescem rápido. Onde estão a fragilidade, a dependência quase que total, e a aquiescência para tudo? Em que parte de sua meninice ficaram o sorriso puro, a voz infantil, o gosto pelas brincadeiras? Quando será que brincaram pela última vez? Em que lugar secreto da infância pela última vez fizeram um carrinho andar pelo chão, imitando o barulho característico?
Nem me atrevo a tentar lembrar quando os fiz dormir pela última vez, ou quando foi a última vez que os peguei no colo. Mas deve ter acabado aos poucos, foram crescendo, e aprendendo a dormir sozinhos, e ficando pesados e desajeitados pra pegar no colo… E hoje se quiser dar um beijo num deles não preciso me curvar, mas preciso coragem pra enxergar, por trás das espinhas que anunciam a barba, algum resquício da criança que habitou aquele corpo.
Há muita coisa a ser compreendida nessa nossa existência. Nós tentaremos, nossos filhos tentarão. Não sei se lograremos descobrir muito mais do que já sabemos. Mas sabemos, por observação, que a Lei é perfeita, então deve haver motivos muito bem justificados para que não nos lembremos de nosso passado de espíritos imortais. Quantas ligações talvez tenhamos com essas criaturinhas que nos nascem como filhos?
Você concebe meio mais eficaz de aprendizado para todos os envolvidos do que as leis que regem a reencarnação? Não é fantástico abrigar em nosso lar e em nosso coração esses espíritos que tanto podem ser velhos amigos como antigos desafetos? Não é uma experiência fabulosa esse negócio de ser pai, mãe, filho, filha?
Cuide seu filho. Se não tem, planeje e cuide. Se não vai ter, ajude quem tem. E cuide seu pai, e sua mãe, e quem tiver cuidado de você. É tudo uma coisa só.