Artigo publicado originalmente em 25/10/2012
É preciso coragem pra ser bom. Se você quiser ser bom de verdade, terá que abandonar essa imagem que você criou com tanto apego.
O Espiritismo ensina que existem dois grandes defeitos humanos; o orgulho e o egoísmo. Todos os outros defeitos, grandes e pequenos, derivam destes dois. O orgulho e o egoísmo são os grandes males da humanidade.
O que chamamos de reforma íntima é uma tentativa de desenvolver as qualidades opostas a esses defeitos. A humildade é o oposto do orgulho e a caridade é o oposto do egoísmo. Provavelmente você se esforça, assim como eu me esforço, para realizar a reforma íntima, para desenvolver as virtudes que lhe faltam.
Mas pode-se ver a coisa por outro ângulo. O que nos falta é humildade e caridade? Sim, parece não haver dúvida em relação a isso. Mas se quisermos admitir outro ponto de vista, podemos chegar à conclusão de que o que nos falta é coragem. Coragem é o que precisamos. Você concorda? Você não acha que é preciso muita coragem para vivenciar o cristianismo? Eu, particularmente, não sei de nada que exija mais coragem.
Não tenho medo de briga, de assalto, de acidente, de tragédia, nada disso me amedronta. Nada disso tira meu sono, nada disso me preocupa. O que me dá medo, e medo de verdade, é ser bom. Nada é mais terrificante do que a ideia de me tornar bom. No entanto, me esforço pra isso todos os dias. Você também se esforça? E acha fácil? Se você quiser ser bom de verdade, terá que abandonar essa imagem que você criou com tanto apego. Essa imagem da qual você tanto se orgulha, essa imagem que você tanto defende, essa imagem que faz você ficar de mal com quem ousa não respeitá-la ou não admirá-la.
Pra ser bom de verdade você terá que desconstruir o personagem que você criou, esse personagem que foi erguido com tanto trabalho. Você demorou pra tomar essa aparência que tem, esse jeito que tem, essa personalidade que você usa. Agora que está acostumado a interpretar esse personagem, terá que desconstruí-lo, pois ele não aceita que você seja bom de verdade.
Confesse que isso dá um medo terrível! Ser caridoso é dar de si mesmo pra alguém que você não conhece; ser humilde é reconhecer sua pequeneza frente ao Universo infinito, admitir que espírito imortal como você existem bilhões. Você não tem medo disso? Não lhe dá medo fazer o que deve ser feito? Fazer o que deve ser feito e que você sabe fazer? Se não é por medo, por que você não faz? Discorde, se quiser. Mas me permita afirmar que se você não tem medo de ser bom ou você é muito melhor do que eu, quase um São Francisco, ou você ainda não entendeu o que é ser bom e o que isso exige.
Nós criamos uma imagem de nós mesmos que não condiz com caridade, não combina com humildade. Nós passamos a vida interpretando um personagem que fingimos considerar muito importante. E quando conseguimos convencer mais pessoas da importância desse personagem, nós mesmos chegamos a nos enganar com ele. E abandonar tudo isso dá medo.
Isso é semelhante ao caso de um operário qualquer, muito zeloso e ambicioso, que todos os meses investe suas economias em material para construir a sua casa. Vai erguendo sua casa pouco a pouco, e ao final de alguns anos ela está pronta. Ele a ergueu com muito trabalho, com muito esforço, com muito capricho. Por isso, ele fecha os olhos para os seus defeitos e remendos. Assim que ela fica pronta, ele ganha um inesperado financiamento para uma casa nova, em melhores condições. Mas para construir a casa nova, é preciso derrubar a casa velha. Sua razão manda que ele escolha a casa nova, melhor que a atual. Mas e o envolvimento emocional com a casa que ele mesmo construiu com tanto zelo?
É preciso coragem pra derrubar a casa velha. Eu venho ensaiando essa coragem todos os dias. E você?