Estudo do Evangelho em vídeo, Vídeo

A parábola do semeador numa visão espírita

Neste vídeo abordamos, numa visão espírita, a parábola do semeador, a cura dos possessos de Gerasa, a tempestade que é acalmada por Jesus, a cura da mulher com fluxo de sangue, a cura ou ressurreição da filha de Jairo, a família de Jesus e outros temas. Todos eles pertencentes ao capítulo 8 do Evangelho de Lucas. Este é o 11º vídeo, de uma série de 30 vídeos em que analisamos o Evangelho segundo Lucas.

Abaixo você pode ler todo o texto do vídeo.

CAPÍTULO 8

1. E aconteceu, depois disto, que andava de cidade em cidade, e de aldeia em aldeia, pregando e anunciando o evangelho do reino de Deus; e os doze iam com ele,
2. E algumas mulheres que haviam sido curadas de espíritos malignos e de enfermidades: Maria, chamada Madalena, da qual saíram sete demônios;
3. E Joana, mulher de Cuza, procurador de Herodes, e Suzana, e muitas outras que o serviam com seus bens.
4. E, ajuntando-se uma grande multidão, e vindo de todas as cidades ter com ele, disse por parábola:
5. Um semeador saiu a semear a sua semente e, quando semeava, caiu alguma junto do caminho, e foi pisada, e as aves do céu a comeram;
6. E outra caiu sobre pedra e, nascida, secou-se, pois que não tinha umidade;
7. E outra caiu entre espinhos e crescendo com ela os espinhos, a sufocaram;
8. E outra caiu em boa terra, e, nascida, produziu fruto, a cento por um. Dizendo ele estas coisas, clamava: Quem tem ouvidos para ouvir, ouça.

Estavam com Jesus os seus apóstolos, algumas mulheres que o seguiam e uma grande multidão. Jesus, como em outras vezes, chama a atenção: “Quem tem ouvidos para ouvir, ouça”.

Todas as palavras que nós precisamos saber para o nosso crescimento espiritual já foram ditas. Nós é que não sabemos ouvir. É preciso termos ouvidos de ouvir, termos ouvidos que ouçam as verdades do espírito.

Jesus sempre se utilizava de exemplos simples, tirados do cotidiano daquelas pessoas que o acompanhavam. Provavelmente aproveitava situações que estavam ocorrendo no momento para ilustrar o seu ensinamento.

Jesus deixou o maior documento espiritual da Terra com o sermão da montanha, relatado em Mateus, que Lucas nos apresenta como o “sermão da planície”. Depois de ter dado um ensino tão elevado e talvez acima do entendimento da maior parte das pessoas, Jesus passa a fazer uso frequente de parábolas. O ensino por parábolas permitia ao povo da época compreender alguma coisa graças às imagens vivas retiradas do seu cotidiano. E as parábolas de Jesus têm a particularidade de serem compreendidas de acordo com os conhecimentos e experiências de quem as interpreta. Cada um, de acordo com o seu adiantamento intelectual e moral, perceberá nas parábolas de Jesus um ensinamento que esteja de acordo com o seu nível.

9. E os seus discípulos o interrogaram, dizendo: Que parábola é esta?
10. E ele disse: A vós vos é dado conhecer os mistérios do reino de Deus, mas aos outros por parábolas, para que vendo, não vejam, e ouvindo, não entendam.

Esta é a única ocasião em que encontramos a palavra “mistérios” nos Evangelhos. A palavra “mistério”, no grego, se relacionava às chamadas religiões de mistérios, em que cada símbolo relacionado tinha significados ocultos. E é exatamente aqui que Jesus explica uma de suas parábolas relacionando a cada símbolo um significado.

Naquele tempo as pessoas que seguiam Jesus, em sua maioria, esperavam que o reino dos judeus fosse devolvido a eles, já que os judeus eram dominados pelos romanos. Um dos mistérios é que o reino de Deus não é um reino material, mas espiritual, e que não está fora de nós, mas dentro de cada um de nós. O reino de Deus é o nosso próximo estágio evolutivo.

O povo esperava um líder guerreiro, como havia sido o rei Davi, mil anos antes, que derrotasse os inimigos romanos. Mas outro mistério é que a vitória a ser conquistada não é por meio da guerra, mas da paz, e que o inimigo a ser derrotado é o nosso próprio orgulho e egoísmo, que é o que nos prende à materialidade. O orgulho e o egoísmo são os maiores adversários do espírito, e é este o sentido da palavra diabo, do grego diabolos, ou da palavra satanás, que no hebraico quer dizer “adversário”.

O povo esperava que o inimigo fosse trucidado como eram trucidados os antigos inimigos dos judeus no Antigo Testamento, em que chamavam a Deus de “O Senhor dos Exércitos”, mas um dos mistérios ensinados por Jesus é que não é com ódio que vencemos o nosso inimigo interno, mas com amor, com o exercício da humildade.

“Para que vendo, não vejam, e ouvindo, não entendam”. – Isto é uma citação do profeta Isaías. Vamos ler o trecho do livro de Isaías a que Jesus se refere para entendermos o que ele quer dizer:

“Então disse ele: Vai, e dize a este povo: Ouvis, de fato, e não entendeis, e vedes, em verdade, mas não percebeis. Engorda o coração deste povo, e faze-lhe pesados os ouvidos, e fecha-lhe os olhos; para que ele não veja com os seus olhos, e não ouça com os seus ouvidos, nem entenda com o seu coração, nem se converta e seja sarado. Então disse eu: Até quando Senhor? E respondeu: Até que sejam desoladas as cidades e fiquem sem habitantes, e as casas sem moradores, e a terra seja de todo assolada. E o Senhor afaste dela os homens, e no meio da terra seja grande o desamparo. Porém ainda a décima parte ficará nela, e tornará a ser pastada; e como o carvalho, e como a azinheira, que depois de se desfolharem, ainda ficam firmes, assim a santa semente será a firmeza dela.” Isaías 6:9-13

A imagem que Jesus nos passa de Deus é totalmente diferente do que nós encontramos no Antigo Testamento. Mas nós devemos entender esta citação de Isaías não como um castigo de Deus, mas como a aplicação natural da Lei de causa e efeito. Não é Deus que impede o povo de ver com os seus olhos e de ouvir com os seus ouvidos as verdades espirituais. São os próprios espíritos, encarnados e desencarnados, que, pela dureza dos seus corações, se tornaram insensíveis para a realidade espiritual. Têm olhos mas não veem, têm ouvidos mas não ouvem.

Podemos ser levados a crer que o propósito de Deus seria a exterminação deste povo, ou destes espíritos. Mas prestemos atenção à ultima sentença: “… e como o carvalho, e como a azinheira, que depois de se desfolharem, ainda ficam firmes, assim a santa semente será a firmeza dela”.

Na septuaginta, a versão grega do Antigo Testamento, não se fala em “azinheira”, mas em “terebinto” (τερεβινθος). Desconhecemos o motivo de traduzir como “azinheira”, que, ao que nos consta, é outra planta.

O terebinto é um grande arbusto que quando o seu tronco é cortado ele volta a brotar, volta a crescer. O carvalho, quanto mais envelhece, mais se aprofundam as suas raízes, e quanto mais podado, mais cresce.

Assim é com os espíritos. Por mais endurecidos que sejam, por mais que permaneçam apegados à matéria sem dar ouvidos à realidade espiritual, conforme vão adquirindo conhecimentos e experiências, através de inúmeras reencarnações, vão crescendo moralmente e aprofundando as suas raízes espirituais como o carvalho. E do mesmo modo que o terebinto, cada vez que perde o corpo físico (simbolizado pelo tronco) volta em outro corpo.

A “santa semente” é justamente a partícula divina que cada um de nós tem dentro de si, o nosso Cristo interno, o logos ou verbo de que nos fala o evangelista João, que vai se desenvolvendo lentamente ao longo de várias passagens pela matéria.

O nosso Cristo interno, ou o logos, na expressão utilizada por João, é a manifestação de Deus na existência – tudo o que existe é manifestação de Deus. O Cristo que cada um tem dentro de si, à espera de desenvolvimento, é a essência de Deus manifestada na existência.

Os espíritos a que se refere Isaías, neste trecho que Jesus citou, por mais duros que sejam, sempre terão novas chances. E ao longo de incontáveis milênios a semente, a “santa semente”, que é a essência de Deus no espírito, vai se regenerando e desenvolvendo.

11. Esta é, pois, a parábola: A semente é a palavra de Deus;
12. E os que estão junto do caminho, estes são os que ouvem; depois vem o diabo, e tira-lhes do coração a palavra, para que não se salvem, crendo;
13. E os que estão sobre pedra, estes são os que, ouvindo a palavra, a recebem com alegria, mas, como não têm raiz, apenas crêem por algum tempo, e no tempo da tentação se desviam;
14. E a que caiu entre espinhos, esses são os que ouviram e, indo por diante, são sufocados com os cuidados e riquezas e deleites da vida, e não dão fruto com perfeição;
15. E a que caiu em boa terra, esses são os que, ouvindo a palavra, a conservam num coração honesto e bom, e dão fruto com perseverança.

Jesus diz que a semente é a palavra de Deus. Há pouco Jesus citou Isaías que fala na “santa semente”, na santa semente que será o tronco que há de brotar novamente.

Aqui Jesus nos dá uma interpretação de fácil assimilação, aplicável à vida de cada um. Mas o simbolismo mais profundo da parábola faz referência à semente como o Cristo interno ou o logos de Deus. “Palavra” em grego é “logos”. O Evangelho de João começa assim:

“No princípio era o logos e o logos estava com Deus e o logos era Deus”. Logos foi traduzido como “verbo”.

“… os que estão junto do caminho, estes são os que ouvem; depois vem o diabo, e tira-lhes do coração a palavra, para que não se salvem, crendo”. – O caminho é uma figura frequentemente utilizada por Jesus para designar exatamente o caminho reto que leva a Deus. Então os que estão junto do caminho são os que estão à beira do caminho, mas ainda fora do caminho, ainda não estão trilhando o caminho reto que leva a Deus.

Eles ouvem, ou seja, sentem por um momento o seu Cristo interno, a sua realidade espiritual, mas o apego à materialidade (que é a significação da palavra “diabo”, o nosso adversário interno, o orgulho e o egoísmo) impede o nosso contato com o Cristo interno.

“… os que estão sobre pedra, estes são os que, ouvindo a palavra, a recebem com alegria, mas, como não têm raiz, apenas crêem por algum tempo, e no tempo da tentação se desviam”. – Jesus usa a pedra como um simbolismo ao se referir ao reconhecimento da sua natureza crística por Pedro quando diz a Pedro: “Tu és pedra e sobre esta pedra edificarei minha comunidade” (Mateus 16:18); também usa a pedra como um simbolismo ao falar que aquele que ouve o seu ensino e o coloca em prática é como aquele que construiu a sua casa sobre a rocha (Mateus 7:24). A semente que caiu sobre a pedra é a semente que caiu sobre uma base sólida, apoiou-se nesta base, que não era sua, pois não fincou raízes, e não resistiu.

É como as pessoas que tomam conhecimento da realidade espiritual com entusiasmo, porque estão apoiadas em líderes religiosos, estão apoiadas em bases sólidas, mas estas bases não são suas. Elas mesmas terão que aprender a enfrentar suas próprias dificuldades, mas para isso terão que criar raízes. Ninguém pode apoiar-se para sempre em ninguém, em nenhum familiar ou líder religioso. A evolução é individual.

Estes espíritos são os que já tiveram um vislumbre do seu Cristo interno, alegram-se com isso, mas não resistem às tentações (ou provações). Vivemos em um planeta de provas. Seremos submetidos a provas por muito tempo ainda. É o meio de que dispomos para consolidar o aprendizado que nos é oferecido.

“… a que caiu entre espinhos, esses são os que ouviram e, indo por diante, são sufocados com os cuidados e riquezas e deleites da vida, e não dão fruto com perfeição”. – As sementes que cresceram entre espinhos são os espíritos já um pouco adiantados, mas ainda comprometidos pela Lei de causa e efeito com espíritos atrasados, que são os espinhos. Vão bem até um certo ponto, mas deixam-se influenciar negativamente até sufocarem o seu Cristo interno de desenvolvimento incipiente.

“… a que caiu em boa terra, esses são os que, ouvindo a palavra, a conservam num coração honesto e bom, e dão fruto com perseverança”. – A semente que caiu em terra boa é o espírito que já despertou para a realidade espiritual, que já sente a existência do Cristo dentro de si.

Se quisermos perceber esta parábola por um ângulo mais terreno, mais próximo, o semeador é qualquer espírito encarnado, de qualquer corrente religiosa ou mesmo ser religião, que se dedique com sinceridade a plantar as verdades espirituais nas mentes dos que estiverem dispostos a ouvi-lo.

Como o semeador é humano como qualquer um de nós, é sujeito a falhas, a precipitações e a más escolhas. Isso explica a má escolha dos terrenos. De cada 4 sementes plantadas, 3 foram atiradas em solo infértil, suas palavras foram jogadas fora. Foram dadas a quem ainda não as merece. Como disse uma vez Jesus, “não dareis as coisas santas aos cães” (Mateus 7:6). Querer esclarecer quem não está preparado é perda de tempo e desperdício de energia.

16. E ninguém, acendendo uma candeia, a cobre com algum vaso, ou a põe debaixo da cama; mas põe-na no velador, para que os que entram vejam a luz.

Candeia era um tipo de lâmpada, um candeeiro que tinha um pavio que se acendia e o combustível era o azeite. Era a lâmpada da época, um recipiente para fazer luz. Ninguém acende a sua própria luz, a luz da sabedoria ou da bondade, mesmo que em estágio inicial, para esconder essa luz, para tapar essa luz debaixo de um vaso ou debaixo da cama.

Essa luz foi conquistada através dos próprios conhecimentos e experiências, representados pelo pavio e pelo azeite, que são os elementos necessários para produzir a luz na candeia.

Nossa luz, por mais opaca que seja, deve servir para iluminar os outros. Devemos compartilhar a nossa luz com quem ainda está no escuro mas está disposto a ver.

O primeiro a ser iluminado pela candeia da sabedoria ou da bondade é sempre quem a possui, é a própria pessoa a primeira a se iluminar com a luz que acende.

Hoje nós precisamos pesquisar para sabermos como era uma candeia. A luz elétrica que temos em nossas casas hoje é incomparavelmente melhor, mais abundante, mais disponível do que a candeia daquele tempo.

Da mesma forma as nossas luzes. Nossos espíritos já têm mais luz do que tinham naquele tempo. Já progredimos um pouco, já iluminamos mais a nós mesmos e temos condições de compartilhar a nossa pequena luz com os outros que ainda vivem na penumbra espiritual.

Cobrir a candeia é egoísmo, não utilizar a nossa luz para iluminar o próximo é egoísmo e insensibilidade.

O velador era um suporte para que a candeia ficasse num lugar alto e iluminasse mais. É o que devemos fazer com a nossa luz. Elevá-la para que todos a vejam, para que todos possam iluminar-se com a nossa luz.

17. Porque não há coisa oculta que não haja de manifestar-se, nem escondida que não haja de saber-se e vir à luz.

 Isso se refere à explicação da parábola. Jesus explicou a parábola para os seus discípulos, mas esta foi uma das inúmeras interpretações possíveis. Assim como há diferença da candeia de azeite para a luz elétrica de hoje, assim também há diferença entre a capacidade de entendimento daquele povo, naquele tempo, e a capacidade de entendimento que temos hoje.

A luz não deve ficar oculta, a luz deve manifestar-se, deve iluminar a todos, nada deve ficar escondido, nenhum sentido oculto deve permanecer oculto, nenhum mistério deve permanecer como mistério, os sentidos ocultos dos ensinamentos de Jesus devem ser expostos, devem vir à luz. Quem tiver ouvidos, ouça.

18. Vede, pois, como ouvis; porque a qualquer que tiver lhe será dado, e a qualquer que não tiver até o que parece ter lhe será tirado.

Quanto mais verdades nós incorporamos, mais verdades recebemos. Não como um privilégio, mas pela maior capacidade de nos apropriarmos das verdades que nos são oferecidas por já termos incorporado algumas verdades.

Jesus deixou claro, em outra ocasião, que ainda tinha muito o que nos dizer mas que nós não suportaríamos mais verdades naquela época (João 16:12).

Hoje temos condições de desvendarmos os mistérios que Jesus não pode revelar quando esteve encarnado porque nós não tínhamos condições de compreender naquela época. A luz excessiva iria nos cegar. Hoje já suportamos uma luz um pouco mais forte, mais brilhante, e mais verdades recebemos.

Mas os que nunca assimilaram verdade alguma, ou que acalentaram mentiras como se fossem verdades, estes não têm condições de assimilar as verdades que estão à nossa disposição e até as suas mentiras tidas como verdades eles perderão. Terão que recomeçar. Sempre há novas chances.

A questão 118 do O Livro dos Espíritos diz que o espírito não retrograda. Ele pode permanecer estacionário, mas não regride. É verdade. Mas o espírito não regride em relação a ele mesmo. Se ele permanece estacionário e outros progridem, ele não regrediu em relação a si mesmo, mas regrediu em relação aos outros, pois a sua distância em relação aos outros aumentou.

Quanto mais o espírito progride, mais condições de progredir ele recebe. Mas o espírito que permaneceu estacionário, até o progresso que já alcançou é perdido se comparado com os outros, pois a distância entre eles aumentou. Ele ficou para trás, não acompanhou o tempo.

19. E foram ter com ele sua mãe e seus irmãos, e não podiam aproximar-se dele, por causa da multidão.
20. E foi-lhe dito: Estão lá fora tua mãe e teus irmãos, que querem ver-te.
21. Mas, respondendo ele, disse-lhes: Minha mãe e meus irmãos são aqueles que ouvem a palavra de Deus e a executam.

No Evangelho de Marcos é dito que a mãe e os irmãos de Jesus achavam que ele “estava fora de si” (Marcos 3:21). Souberam que multidões o seguiam, que ele muitas vezes não tinha nem tempo de comer e acharam que ele estava louco.

A reação de Jesus não tem nada de dura, pelo contrário, está totalmente de acordo com o seu ensinamento. Jesus nos diz que devemos amar a todos, que não há mérito algum em amar somente a quem nos ama, pois este amor é condicional, não é o verdadeiro amor.

Isso não quer dizer que nós devemos abrir mão de nossa família. Se reencarnamos próximos uns dos outros algum motivo há para isso, pois nada é por acaso. O lar é o laboratório da espiritualidade. Mas nós somos irmãos em Deus, todos fomos creados por Deus, todos temos o mesmo Pai.

Aqui novamente Jesus fala na “palavra de Deus”. Claro que isso também se refere a coisas práticas, ao ensino das coisas espirituais. Mas a “palavra de Deus” é a manifestação de Deus, é a manifestação da essência de Deus em forma de existência.

Lembramos que “palavra” em grego é logos, que foi traduzido no Evangelho de João como “Verbo”. O Verbo de Deus, ou a Palavra de Deus, ou o Logos de Deus está em nós, é Deus em nós, é a partícula divina, é o nosso Cristo interno.

Quem ouve o Cristo interno, quem ouve a voz do seu Cristo interno, quem ouve a palavra de Deus dentro de si é da família de Jesus.

Quem pratica a palavra de Deus, quem coloca em prática, ou seja, quem externaliza, quem manifesta a palavra de Deus que está dentro de si, o logos de Deus, ou o seu Cristo interno, este é da família de Jesus.

Jesus é pura manifestação de Deus, porque desenvolveu plenamente a palavra, o verbo, o logos de Deus, Jesus desenvolveu plenamente o seu Cristo interno, por isso Jesus é O Cristo, porque ele anulou a sua personalidade, Jesus anulou o seu ego e manifestou com plenitude o Cristo que está dentro de cada um de nós.

Nós somos filhos de Deus e somos ligados um ao outro pelo nosso Cristo interno, que João chama de logos, que traduzido quer dizer “verbo” ou “palavra”.

Nós temos nossos familiares segundo a carne, que são a nossa família terrena, transitória, e temos a nossa família espiritual, que é a ligação que temos uns com os outros pelo nosso Cristo interno. 

Os parentes segundo a carne, a família terrena, tem em comum uns com os outros o sangue. São ligados pelo sangue. A família espiritual tem em comum a filiação divina, todos são filhos de Deus e tem em comum o Cristo interno, a manifestação da essência de Deus na existência de cada um. 

22. E aconteceu que, num daqueles dias, entrou num barco com seus discípulos, e disse-lhes: Passemos para o outro lado do lago. E partiram.
23. E, navegando eles, adormeceu; e sobreveio uma tempestade de vento no lago, e enchiam-se de água, estando em perigo.
24. E, chegando-se a ele, o despertaram, dizendo: Mestre, Mestre, perecemos. E ele, levantando-se, repreendeu o vento e a fúria da água; e cessaram, e fez-se bonança.
25. E disse-lhes: Onde está a vossa fé? E eles, temendo, maravilharam-se, dizendo uns aos outros: Quem é este, que até aos ventos e à água manda, e lhe obedecem?

Pelo ponto de vista físico não precisamos recorrer à crença em milagres para explicar o fato de Jesus ter feito cessar a tempestade. Jesus, pelo seu imenso adiantamento espiritual, conhece leis físicas que nós não conhecemos.

Pouco mais de cem anos atrás nós não conhecíamos a eletricidade. Nada do que você tem na sua casa e que funciona graças à eletricidade, nada disso existia. E se alguém dessa época, mais de cem anos atrás, visitasse a sua casa e se deparasse com os aparelhos que você usa, com o seu computador e com toda a tecnologia que hoje existe e que antes não conhecíamos, talvez ele pensasse se tratar de um milagre.

Assim como pouco tempo atrás nós não conhecíamos as leis que regulam a eletricidade, assim um dia iremos conhecer outras leis da natureza que hoje para nós são um mistério.

A eletricidade já existia, as suas leis já existiam, nós é que não as conhecíamos. Do mesmo modo, Jesus conhecia leis que nós não conhecemos e tinha domínio sobre os elementos da natureza.

O simbolismo que nós encontramos é muito simples. Jesus com os seus discípulos entram num barco e vão para a outra margem, a outra margem que é o outro plano – representa quem vem do plano astral para o plano físico, quem vem para o plano físico cheio de boas intenções, cheio de boa disposição para executar as tarefas que lhe foram atribuídas. Vem para o plano físico com o Cristo, mas, quando as tempestades da vida começam, quando as dificuldades apertam, imediatamente recorre a pedidos de ajuda religiosa.

Jesus atendeu aos seus discípulos quando pediram socorro a ele, mas perguntou onde estava a sua fé. Jesus está indicando que devemos aprender a nos bastarmos por nós mesmos, que devemos nos mover com nossas próprias forças, pois temos o nosso Cristo interno.

O simbolismo deste acontecimento nos mostra que estes espíritos, representados pelos discípulos, vieram para a outra margem, ou seja, reencarnaram com o Cristo. Mas depois o Cristo adormeceu. O seu Cristo interno adormeceu em seus corações, deixaram dormir o seu Cristo, perderam o contato com o Cristo. Só se lembraram dele quando vieram as tempestades, as dificuldades da vida.

Vale a pena lembrar que os povos antigos consideravam essas forças da natureza como deuses, de modo semelhante ao que as religiões de origem africana fazem ainda hoje.

Os gregos tinham o deus Éolo, que era o deus dos ventos, responsável pelos ventos. Foi Éolo quem disse a Ulisses uma famosa frase que se adapta a esta passagem do Evangelho: “Quem semeia ventos colhe tempestades”.  Lei de causa e efeito.

26. E navegaram para a terra dos gadarenos, que está defronte da Galiléia.
27. E, quando desceu para terra, saiu-lhe ao encontro, vindo da cidade, um homem que desde muito tempo estava possesso de demônios, e não andava vestido, nem habitava em qualquer casa, mas nos sepulcros.
28. E, quando viu a Jesus, prostrou-se diante dele, exclamando, e dizendo com grande voz: Que tenho eu contigo, Jesus, Filho do Deus Altíssimo? Peço-te que não me atormentes.
29. Porque tinha ordenado ao espírito imundo que saísse daquele homem; pois já havia muito tempo que o arrebatava. E guardavam-no preso, com grilhões e cadeias; mas, quebrando as prisões, era impelido pelo demônio para os desertos.
30. E perguntou-lhe Jesus, dizendo: Qual é o teu nome? E ele disse: Legião; porque tinham entrado nele muitos demônios.
31. E rogavam-lhe que os não mandasse para o abismo.
32. E andava ali pastando no monte uma vara de muitos porcos; e rogaram-lhe que lhes concedesse entrar neles; e concedeu-lho.
33. E, tendo saído os demônios do homem, entraram nos porcos, e a manada precipitou-se de um despenhadeiro no lago, e afogou-se.
34. E aqueles que os guardavam, vendo o que acontecera, fugiram, e foram anunciá-lo na cidade e nos campos.
35. E saíram a ver o que tinha acontecido, e vieram ter com Jesus. Acharam então o homem, de quem haviam saído os demônios, vestido, e em seu juízo, assentado aos pés de Jesus; e temeram.
36. E os que tinham visto contaram-lhes também como fora salvo aquele endemoninhado.
37. E toda a multidão da terra dos gadarenos ao redor lhe rogou que se retirasse deles; porque estavam possuídos de grande temor. E entrando ele no barco, voltou.
38. E aquele homem, de quem haviam saído os demônios, rogou-lhe que o deixasse estar com ele; mas Jesus o despediu, dizendo:
39. Torna para tua casa, e conta quão grandes coisas te fez Deus. E ele foi apregoando por toda a cidade quão grandes coisas Jesus lhe tinha feito.

A palavra grega daimon, de onde deriva “demônio”, quer dizer “espírito”. Para os judeus da época, conforme se depreende do estudo dos Evangelhos e de acordo com o que nos informa o historiador Flavio Josefo, que viveu naquela época, demônios eram os espíritos dos homens perversos.

Não existe demônio como um ser dedicado exclusivamente a fazer o mal. O que se chama demônio são espíritos atrasados, ainda muito animalizados, que vivem dominados pelos instintos. Mas um dia eles evoluirão como qualquer outro espírito.

Havia ali um homem obsediado, o que poderíamos chamar de uma obsessão complexa, pois vários espíritos o vampirizavam. A resposta do espírito demonstra isso. Jesus lhe pergunta o seu nome e ele diz que o seu nome é legião, porque eram muitos. Uma legião era um destacamento do exército romano composto de seis mil homens.

É interessante notar que este espírito, atrasado e animalizado, reconhecia a grandeza de Jesus. O chama de “Filho do Deus Altíssimo”.

Este espírito obsessor, que fala em nome dos outros, pede que Jesus não o atormente, pede que Jesus não o mande para o abismo. O abismo são as regiões do astral inferior, as regiões que foram descritas por Dante como o inferno.

Esses espíritos eram vampirizadores, sugavam as energias do obsediado e as energias remanescentes dos corpos dos mortos, pois o obsediado vivia nos sepulcros.

Ele pede a Jesus que os deixasse entrar nos porcos. Nós sabemos que os espíritos não podem entrar nos corpos dos animais, aliás, os espíritos também não “entram” nos corpos humanos. A palavra “incorporação” dá a ideia de que o espírito desencarnado entra no corpo do espírito encarnado, mas a ligação entre os dois se dá através do perispírito.

Mas esses espíritos vampirizadores, no desespero por perderem o contato com o espírito encarnado que eles obsediavam, se contentam em sugar as energias vitais dos porcos. Isso não é em nada diferente do que os sacrifícios de animais que se faz em algumas religiões de origem africana.

André Luiz narra no capítulo 11 do livro Missionários da Luz a ação vampirizadora de espíritos atrasados num matadouro, onde sugavam as forças vitais presentes no plasma sanguíneo dos animais.

Os porcos, sentindo a vibração negativa destes espíritos, se assustaram e caíram no despenhadeiro. Nós sabemos que os animais percebem coisas que nós não percebemos. Há quem afirme que os animais vivem concomitantemente nos planos astral e físico.

As pessoas da região, quando viram o que havia acontecido, pediram a Jesus que fosse embora. Elas conheciam o obsediado, que certamente era tido por louco, já que vivia sem roupas, em meio aos sepulcros, era um homem violento, e quando elas viram que ele estava bem, que estava vestido, sentado, calmo, em perfeito juízo, em vez de ficarem felizes com o acontecimento inesperado, se preocuparam com o prejuízo pela perda dos porcos.

Elas representam as pessoas que não querem mudar, as pessoas que notam o que o Cristo é capaz de fazer, notam as transformações que o Cristo promove na vida das pessoas, mas não querem mudar. Não querem ter prejuízos materiais, não querem que o seu estilo de vida seja alterado. Preferem a animalidade, representada pelos porcos, do que a libertação espiritual representada pelo afastamento dos espíritos vampirizadores.

O homem pede a Jesus para que o deixe segui-lo, mas Jesus não permite. Jesus pede que ele fique e conte para as pessoas da cidade o que Deus havia feito por ele. E foi o que ele fez.

Isso demonstra que nem todos estão preparados para seguir o Cristo. Muitos, ainda, apesar da sua boa vontade, não estão aptos a compreender o Cristo, mas mesmo assim são úteis para disseminarem entre os seus próximos as suas experiências com Deus. Assim é em muitas comunidades em que líderes religiosos locais exercem influência sobre as pessoas dessas comunidades, preparando-as, pouco a pouco, para a ideia de Deus.

40. E aconteceu que, quando voltou Jesus, a multidão o recebeu, porque todos o estavam esperando.
41. E eis que chegou um homem de nome Jairo, que era príncipe da sinagoga; e, prostrando-se aos pés de Jesus, rogava-lhe que entrasse em sua casa;
42. Porque tinha uma filha única, quase de doze anos, que estava à morte. E indo ele, apertava-o a multidão.
43. E uma mulher, que tinha um fluxo de sangue, havia doze anos, e gastara com os médicos todos os seus haveres, e por nenhum pudera ser curada,
44. Chegando por detrás dele, tocou na orla do seu vestido, e logo estancou o fluxo do seu sangue.
45. E disse Jesus: Quem é que me tocou? E, negando todos, disse Pedro e os que estavam com ele: Mestre, a multidão te aperta e te oprime, e dizes: Quem é que me tocou?
46. E disse Jesus: Alguém me tocou, porque bem conheci que de mim saiu virtude.
47. Então, vendo a mulher que não podia ocultar-se, aproximou-se tremendo e, prostrando-se ante ele, declarou-lhe diante de todo o povo a causa por que lhe havia tocado, e como logo sarara.
48. E ele lhe disse: Tem bom ânimo, filha, a tua fé te salvou; vai em paz.
49. Estando ele ainda falando, chegou um dos do príncipe da sinagoga, dizendo: A tua filha já está morta, não incomodes o Mestre.
50. Jesus, porém, ouvindo-o, respondeu-lhe, dizendo: Não temas; crê somente, e será salva.
51. E, entrando em casa, a ninguém deixou entrar, senão a Pedro, e a Tiago, e a João, e ao pai e a mãe da menina.
52. E todos choravam, e a pranteavam; e ele disse: Não choreis; não está morta, mas dorme.
53. E riam-se dele, sabendo que estava morta.
54. Mas ele, pondo-os todos fora, e pegando-lhe na mão, clamou, dizendo: Levanta-te, menina.
55. E o seu espírito voltou, e ela logo se levantou; e Jesus mandou que lhe dessem de comer.
56. E seus pais ficaram maravilhados; e ele lhes mandou que a ninguém dissessem o que havia sucedido.

Aqui nós temos duas histórias intercaladas, uma história inserida dentro de outra.

Jairo era o chefe da sinagoga. Era, então, uma autoridade religiosa. A sua filha tem doze anos e está morrendo. Doze anos era a idade a partir da qual a menina era considerada moça e já podia casar. As mulheres casavam aos doze ou treze anos de idade.

Enquanto Jesus se dirigia à casa de Jairo, cercado pela multidão, uma mulher toca na borla do seu manto, nas franjas do manto de Jesus, aqui traduzido como “orla do vestido”. Esta mulher sofria de uma hemorragia, de um fluxo de sangue, também há doze anos.

O papel da mulher, naquele tempo e para aquele povo, era ter filhos, tanto que a esterilidade era considerada um castigo divino. Nós vimos no capítulo 1 que Izabel, a mãe de João Batista, vivia a situação vergonhosa de ser estéril – o preconceito não podia admitir a hipótese de o homem ser estéril.

A filha de Jairo estava morrendo na idade em que se tornaria fértil, pronta para casar. A hemorroíssa, a mulher com fluxo de sangue, há doze anos, o mesmo tempo de vida da menina, era infértil por sua condição de saúde, o que a tornava legalmente impura.

Pelas leis de Moisés, que alguns ainda acham que eram leis de Deus, a mulher nos dias de sua menstruação ou enquanto perdurasse o seu fluxo de sangue era considerada impura. Não podia tocar em ninguém e em nenhum objeto. Todo o objeto em que ela tocasse se tornava impuro (Levítico 15:19-29). Esta mulher, então, vivia há doze anos afastada de tudo e de todos, isolada da sociedade, pois era impura aos olhos da religião.

A menina era submetida à lei religiosa, pois seu pai representava a lei religiosa como chefe da sinagoga; a mulher era fora-da-lei por causa da religião, pois era considerada impura.

Estas duas mulheres representam a vida estéril, a vida sem obras, sem frutos. Não podemos ignorar aqui o número 12. Uma ia morrer aos doze anos sem ter dado frutos, a outra há doze anos sofria de um mal que a impedia de dar frutos. Embora a análise a que nós nos propomos desconsidere números cabalísticos ou numerologia, a simbologia do número 12 é suficientemente conhecida e certamente proposital nesta passagem do Evangelho.

O 12 representa o todo, um ciclo completo. No Antigo Testamento o povo escolhido de Deus são as 12 tribos de Israel; Jesus escolheu 12 apóstolos para disseminarem o seu ensino; a Terra realiza um ciclo completo em torno do Sol em 12 meses.

Essas duas mulheres foram curadas porque cumpriram o seu “ciclo cármico” e se libertaram dos seus erros do passado. Assim, a criança morre e renasce como uma mulher, pois naquele tempo aos doze anos as meninas eram consideradas mulheres; e a mulher retoma a sua condição de mulher fértil.

A mulher perdia a sua vida, simbolizada pelo sangue (Levítico 17:11-14), a sua vida se esvaía sem que ela produzisse frutos. Completado o seu ciclo, ela retorna a Deus. Ela sabia que bastava encostar nas borlas do manto de Jesus para que ficasse curada. As borlas do manto tinham fios bordados em branco e um fio azul que lembravam as leis de Deus (Números 37:40). Por isso, a mulher encontra as Leis de Deus através do Cristo. Vai em busca das leis de Deus, simbolizadas pela borla do manto de Jesus, o Cristo.

Como Jesus mesmo disse, a menina não estava morta. Assim como o filho da viúva de Naim, no capítulo anterior, ela estava num estado de catalepsia ou letargia. Jesus pegou na mão da menina e disse para ela levantar-se.

Assim todos nós, quando renascemos para a vida fértil e produtiva através do Cristo, temos que nos levantar e caminhar com as nossas próprias pernas.

Vimos mais uma vez que o Cristo está dentro de cada um de nós, que temos que fazer brilhar a nossa luz para iluminar o próximo, assim como somos iluminados por quem tem mais luz do que nós.

Vimos, tanto no episódio da tempestade como na história da filha de Jairo, que temos que nos bastar a nós mesmos, caminhar com as próprias pernas, e que o caminho a ser trilhado é o caminho reto das Leis de Deus.

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