ARTIGO DE AUTORIA DE ANA BLUME
A fé, destituída da razão, não serve para muita coisa. A fé renovada, trazida a nós pela Doutrina Espírita, transcende a racionalidade.
Tomando como ponto de partida o mito de origem da humanidade retratado no Evangelho, ou seja, a história de Adão e Eva e sua expulsão do paraíso edênico, pode-se afirmar que a Razão é o primeiro impulso humano. É o desejo do conhecimento, da ciência, a vontade de saber tudo através de seus próprios meios. Por si só, tal atitude não tem nada de repreensível, e a “expulsão do paraíso” não significa a repreensão – antes, ela significa o afastamento do homem da fé cega, para que, após adquirir o conhecimento necessário, retorne à fé, mas a uma nova fé.
A fé, destituída da razão, não serve para muita coisa – sem o conhecimento de causa, ela se assemelha mais à submissão e talvez até a uma certa imaturidade espiritual. A fé renovada, trazida a nós pela Doutrina Espírita, acontece através da transcendência da própria racionalidade.
O espírito atinge a maturidade da fé a partir do momento em que, adquirido certo grau de conhecimento, que em muitos casos pode empurrá-lo na direção do infértil ceticismo, ele o transcende e cria a coragem e a humildade para crer naquilo que, no meio científico materialista, é julgado “inviável”. A razão é necessária, pois o conhecimento e o amadurecimento intelectual são necessários, mas tornar-se prisioneiro da matéria e do “ver para crer” é uma falha tão grande quanto a fé cega, tão reprovada pelos mesmos meios científicos.
Os homens foram colocados no mundo (ou “afastados do paraíso”) para que aprendam por si mesmos, seguindo o mesmo princípio do conhecimento empírico para que, só então, reconheçam com humildade que a “razão pura” tem limites: ela abrange certos graus de conhecimento, mas é incapaz de transcender a matéria.
Segundo Platão, a Verdade não pode ser alcançada somente através do exercício da dialética, que se baseia no princípio de que toda hipótese encontrará sua antítese e então, a partir da união das duas, será gerada uma tese, que se transformará numa hipótese, encontrará sua antítese, e assim por diante – sendo esse o princípio de todo pensamento racional: para Platão, a dialética pode explicar o mundo até certo ponto e, após isso, é preciso elevar-se acima dela e, através de Eros (o Amor), encontrar a Verdade.
O Eros de que fala Platão é precisamente a fé renovada da qual falamos.
Não se trata de abandonar a capacidade de pensamento crítico – muito pelo contrário; o pensamento crítico e racional é em realidade um degrau necessário para a ascensão ao verdadeiro pensamento, que se desliga da matéria para superá-la.
Da mesma forma, o corpo é necessário para a vida na Terra, e reconhecemos suas limitações: ele precisa de alimento, descanso e saúde para funcionar, o que impossibilita sua autonomia; a razão, também, não é autônoma. Assim como o espírito imortal se aprimora através da vivência terrena, o pensamento se aprimora através da razão – e a consciência da vida espiritual, além da matéria, é exatamente a consciência da fé, que é o pensamento autônomo, completo, que articula o conhecimento terreno com o conhecimento espiritual: a maturidade última do pensamento.
Ana Blume é estudante de Sociologia e espírita desde os 7 anos – Idealizadora do blog “O Evangelho Segundo o Espiritismo Simplificado”