Você acha que espírita também vai para o umbral? Há quem pense que o espírita tenha privilégios, talvez pela caridade praticada. Neste vídeo de apenas 6 minutos, exponho um pensamento que responde a perguntas que venho recebendo neste sentido. Não somos seres especiais. Temos, supostamente, mais esclarecimento; consequentemente, nossa responsabilidade é maior. Se preferir, leia o texto logo abaixo.
Pergunta-se, entre os espíritas, se espírita vai para o umbral. Evidente que sim. No que que os espíritas seriam melhores do que os outros? Por terem mais conhecimento? Por terem mais esclarecimento? Por praticarem a caridade? E quem disse que os outros não praticam a caridade? E quem disse que a caridade praticada pelos espíritas é realmente eficiente?
Que espírita também vai para o umbral, isso é certo. É possível que por ter maior conhecimento da espiritualidade, o espírita tenha uma maior facilidade de sair do umbral mais rapidamente. Eu chego a essa conclusão através da leitura de obras espíritas e por algumas experiências de desdobramento em que percebemos que o que efetivamente conta é o nosso estado mental.
Se espírita vai para o umbral, e se é certo que nenhum de nós gostaria de ir para o umbral, surge a discussão sobre o que devemos fazer para evitar o umbral – ou para ficarmos lá o menor tempo possível.
Alguns dizem que o meio mais eficaz de nós nos elevarmos é através da prática, através da caridade, das boas ações; outros dizem que o que realmente importa é o que se convencionou chamar de reforma íntima – que talvez nem seja o termo mais adequado, já que “reforma” dá a ideia de que já existe algo dentro de nós para ser reformado, e isso nem sempre corresponde à verdade.
Jesus nos chama a atenção para o que no grego é chamado de metanoia, e as traduções bíblicas geralmente traduzem como “arrependimento” ou “conversão”, mas que literalmente quer dizer “mudança mental”, “transformação da mente”. Podemos conceber isso como conscientização – quando nos conscientizamos nós efetivamente iniciamos o caminho da mudança.
Há uma passagem nos Evangelhos (não vou discuti-la, apenas citá-la rapidamente) em que Jesus está na casa de duas mulheres: Marta e Maria; são duas irmãs. Enquanto Maria está aos pés de Jesus, Marta está atarefada, talvez preparando alguma coisa para Jesus comer, e Marta vai reclamar a Jesus de que enquanto ela está atarefada, Maria está parada aos pés de Jesus, e, na opinião de Marta, sem fazer nada. Marta pede a Jesus que mande Maria ajudá-la, e Jesus diz: – Marta, Marta, estás atarefada com tantas coisas, mas uma só coisa importa efetivamente.
A partir dessa declaração de Jesus, muitos imaginam – talvez com razão – que o que vale realmente é buscar o Cristo, é a proximidade com o Cristo, que é o que Maria estava fazendo. Marta, por outro lado, estava ocupada com coisas materiais para agradar Jesus.
Então Maria seria aquele que busca o Cristo dentro de si e a proximidade com o seu Cristo interno, enquanto Marta representaria aquele que busca as tarefas materiais, aquele que pratica efetivamente a caridade, que trabalha em benefício do próximo – mas que às vezes perde o contato com o seu Cristo interno.
O que devemos fazer?
Não chegamos ainda num estágio (eu pelo menos não cheguei) de ter condições de desenvolver tão plenamente o Cristo interno que todos nós temos dentro de nós (pelo menos em estado embrionário), de ficarmos tão bem, tão elevados, a ponto de naturalmente melhorar a vida daqueles que nos rodeiam, melhorar a vida do próximo só pela nossa presença, só pelo nosso contato. Chegaremos a esse ponto um dia; não chegamos ainda. Talvez você tenha chegado; eu não cheguei.
Então não devemos abrir mão de nos doar ao próximo, de trabalhar em benefício do próximo. E neste ponto entra o egoísmo do espírita, porque, se analisarmos com um pouquinho mais de profundidade, não importa se trabalhando em benefício do próximo nós vamos nos elevar ou não, não importa se ajudando o próximo nós vamos nos livrar do umbral ou não.
Nós estamos fazendo a caridade com interesse? Nós estamos sendo calculistas?
Temos que trabalhar em benefício do próximo como um dever. Todos nós já cometemos inúmeros erros no passado e é nosso dever compensar parte desses erros trabalhando em benefício do próximo, doando ao próximo aquilo que nós já adquirimos – e que não é efetivamente nosso.
Os nossos conhecimentos e experiências, as nossas aquisições morais, pertencem a Deus. Se nós conseguimos até hoje captar um pouco mais desses conhecimentos, perceber um pouco mais da grandeza de Deus, nós temos o dever de passar isso adiante, sem importar se com isso nos livramos do umbral ou não.
Não podemos nos tornar calculistas. Fazer o bem é dever, é obrigação, é indiscutível. Se temos condições de seguir essa declaração de Jesus que “uma coisa só efetivamente importa” (e provavelmente seria o que Maria estava fazendo, que é estar próximo do Cristo, buscando a intimidade com o Cristo), isso depende de cada um e isso depende do estágio evolutivo de cada um; isso cada um tem que buscar por si, é realmente uma busca individual – mas fazer o bem ao próximo é dever, isso é indiscutível.
E não devemos nos questionar se com isso nos elevaremos ou não. É evidente que aquele que pratica a caridade constantemente atrai para junto de si companhias espirituais mais elevadas. Os espíritos trabalhadores desencarnados precisam de encarnados que sejam instrumentos do bem, que trabalhem em benefício do próximo – então é lógico que trabalhando em benefício do próximo nós somos naturalmente melhor acompanhados espiritualmente, mas não devemos cair no erro grosseiro de nos tornarmos calculistas e anotar pontos no nosso caderninho a cada boa ação ou suposta boa ação que praticamos.