Neste vídeo analisamos dois episódios do início do capítulo 12 do Evangelho de João: a unção de Jesus por Maria, irmã de Lázaro, e a entrada triunfal de Jesus em Jerusalém, montado sobre um jumentinho. Vamos ver que Jesus não é um milagreiro, ao gosto dos que esperam uma salvação externa, vinda de fora. Este é o 21º vídeo desta série de estudos sobre o Evangelho de João.
Abaixo você pode ler todo o texto do vídeo.
JOÃO 12:1-19
- Foi, pois, Jesus seis dias antes da páscoa a betânia, onde estava Lázaro, o que falecera, e a quem ressuscitara dentre os mortos.
- Fizeram-lhe, pois, ali uma ceia, e Marta servia, e Lázaro era um dos que estavam à mesa com ele.
- Então Maria, tomando um arrátel de ungüento de nardo puro, de muito preço, ungiu os pés de Jesus, e enxugou-lhe os pés com os seus cabelos; e encheu-se a casa do cheiro do ungüento.
- Então, um dos seus discípulos, Judas Iscariotes, filho de Simão, o que havia de traí-lo, disse:
- Por que não se vendeu este ungüento por trezentos dinheiros e não se deu aos pobres?
- Ora, ele disse isto, não pelo cuidado que tivesse dos pobres, mas porque era ladrão e tinha a bolsa, e tirava o que ali se lançava.
- Disse, pois, Jesus: Deixai-a; para o dia da minha sepultura guardou isto;
- Porque os pobres sempre os tendes convosco, mas a mim nem sempre me tendes.
“Judas, o que havia de traí-lo” – na verdade a palavra não é “trair”, mas “entregar”: ο μελλων αυτον παραδιδοναι – “o que estava pronto para o entregar”; ou “o que pretendia entregá-lo”. João é o único a dizer que Judas era ladrão. Os outros evangelistas não se referem assim a Judas. Não podemos esquecer da forte animosidade que havia entre os judeus e os cristãos na época em que este Evangelho foi escrito. O nome Judas é a helenização do nome “Judá”, de onde descendem os judeus.
Judá é uma das doze tribos de Israel. Jacó, também chamado Israel, teve doze filhos, cada filho deu origem a uma tribo, e a principal tribo a dar continuidade aos israelitas, foi a tribo de Judá.
Além disso, Judas era o único dos doze discípulos mais próximos de Jesus que era judeu – os outros eram galileus, assim como Jesus.
O nardo é uma substância perfumada que possui propriedades medicinais. Pastorino diz que o nardo utilizado em Jesus tinha propriedades anestésicas e analgésicas. Em poucos dias Jesus seria crucificado, e antes de ser crucificado seria açoitado. O nardo ajudaria a insensibilizar parcialmente o seu corpo à dor.
Uma curiosidade: o nardo era puro – a palavra traduzida como “puro” é pistikos (πιστικος), derivado de pistis (πιστις), que é normalmente traduzido como “fé” ou como “crença”. Aqui fica demonstrado mais uma vez que pistis é muito mais do que apenas “crença”. Aqui dá a ideia de pureza, ou seja, sem mistura, fiel ao original. Pistis é “fidelidade ao original”. Ter fé em Deus é ser fiel à nossa origem, que é Deus.
Neste mesmo versículo três, quando é dito que Maria ungiu os pés de Jesus, o verbo traduzido como “ungir” é eleipsen (ηλειψεν), indicativo aoristo, na voz ativa, terceira pessoa do singular do verbo aleipho (αλειφω) que se refere a ungir medicinalmente ou à unção que se fazia nos corpos dos mortos antes de sepultá-los. E é isso que Jesus diz – que ela havia guardado isso para o dia da sua sepultura. Fica evidente que Jesus sabia que ia morrer, e não só sabia como se preparava para isso.
“(…) os pobres sempre os tendes convosco, mas a mim nem sempre me tendes” – os pobres a que Judas e Jesus se referem são os mendigos, os pedintes. A palavra grega é ptóchos πτωχος, a mesma palavra que é citada na primeira bem-aventurança, no sermão da montanha: “Bem-aventurados os mendigos de espírito” (Mateus 5:3) – ou seja, aqueles que mendigam, que pedem, que imploram as coisas do espírito.
Pobre, no sentido de ter poucos recursos, é penes (πενης). Sempre haverá espíritos em situação de mendicância. A creação é permanente e infinita, Deus nunca pára de crear. Sempre haverá espíritos jovens, em fase de aprendizado, experimentando dificuldades e precisando de ajuda. É uma das etapas do longo processo de evolução espiritual.
- E muita gente dos judeus soube que ele estava ali; e foram, não só por causa de Jesus, mas também para ver a Lázaro, a quem ressuscitara dentre os mortos.
- E os principais dos sacerdotes tomaram deliberação para matar também a Lázaro;
- Porque muitos dos judeus, por causa dele, iam e criam em Jesus.
- No dia seguinte, ouvindo uma grande multidão, que viera à festa, que Jesus vinha a Jerusalém,
- Tomaram ramos de palmeiras, e saíram-lhe ao encontro, e clamavam: Hosana! Bendito o Rei de Israel que vem em nome do Senhor.
- E achou Jesus um jumentinho, e assentou-se sobre ele, como está escrito:
- Não temas, ó filha de Sião; eis que o teu Rei vem assentado sobre o filho de uma jumenta.
- Os seus discípulos, porém, não entenderam isto no princípio; mas, quando Jesus foi glorificado, então se lembraram de que isto estava escrito dele, e que isto lhe fizeram.
O evangelista, que escreveu este Evangelho em Éfeso, se dirigia aos gregos. E tentava demonstrar aos gregos que Jesus era o cumprimento das escrituras. No Evangelho de Mateus isso é muito mais enfatizado. Como Mateus escreveu para os próprios judeus, ele não poupa citações das escrituras na tentativa de demonstrar que Jesus era o messias prometido.
Aqui diz que mais tarde os discípulos lembraram de que isto estava escrito a respeito de Jesus e que isto lhe fizeram. A referência sobre o que está escrito é Isaías 62:11 e Zacarias 9:9.
O que nós percebemos é que Jesus comandou todo o processo. É claro que Jesus não poderia obrigar os homens a aderir a ele, como em relação à maior parte dos fariseus, que, embora bastante esclarecidos, haviam se perdido em suas leis e tradições e esquecido a razão pela qual as leis e as tradições existiam. Mas Jesus conduziu os fatos de modo que a sua missão ficasse fortemente gravada no espírito de quem se envolveu de alguma forma com ele.
Seria um exagero pensarmos que Jesus abalou o mundo naquele momento. Isso não aconteceu – tanto é que não há registros consistentes da vida Jesus além dos Evangelhos. O Jesus histórico foi um evento breve e que não foi notado por muitas pessoas. Mas quem contatou com Jesus – seja de modo favorável a ele ou não – ficou marcado. E isso foi suficiente para imortalizar a sua missão.
Poucas palavras de Jesus chegaram até nós. Mais do que com palavras, Jesus nos ensinou através de simbolismos. A entrada de Jesus em Jerusalém assentado sobre um jumentinho também guarda um simbolismo importante.
Jerusalém quer dizer “visão da paz”, e para chegar a Jerusalém é preciso subir, pois é uma cidade alta. Para subir a Jerusalém (para subir para a visão da paz), para elevar-se e ver a paz é preciso que o Cristo (representado por Jesus) esteja assentado sobre o animal. O nosso Cristo interno (que é a partícula de Deus em nós) deve estar acima do animal, deve ter pleno domínio sobre o animal.
A maior parte da população do planeta ainda vive como animais. São animais domesticados e mais ou menos civilizados. Vivem em casas, constroem coisas – mas pouco se diferenciam dos animais. Comem, bebem, dormem, se reproduzem e vivem em estado contemplativo em frente à televisão.
Jesus nos deixou como ensinamento, há dois mil anos, que nossa parte espiritual, divina, imortal, deve dominar a nossa parte animal, a herança do nosso estágio evolutivo anterior.
- A multidão, pois, que estava com ele quando Lázaro foi chamado da sepultura, testificava que ele o ressuscitara dentre os mortos.
- Por isso a multidão lhe saiu ao encontro, porque tinham ouvido que ele fizera este sinal.
- Disseram, pois, os fariseus entre si: Vedes que nada aproveitais? Eis que toda a gente vai após ele.
Essas pessoas que saíram ao encontro de Jesus estavam entusiasmadas porque haviam entendido – como entendem ainda hoje – que Jesus ressuscitou um homem.
Lembramos que semeion (σημειων), que é traduzido como “sinal” ou “milagre”, também quer dizer “símbolo” – e é disso que se tratava, de um símbolo. Todo o ensino mais profundo de Jesus era dado em forma de simbolismos.
Mas o povo não estava interessado em ensinamentos. A grande massa até hoje não está interessada em ensinamentos. Aprender geralmente dá trabalho – principalmente se for para se colocar em prática. É mais fácil esperar por um milagreiro que resolva todos os nossos problemas.
Saudavam Jesus como o “rei de Israel que vem em nome do Senhor”. Jesus não é rei de Israel. Jesus não é rei de um povo. O “Senhor” a que eles se referiam é o seu deus, Javé, o deus de um povo, um deus que tinha preferência por um povo, que iria derrotar os inimigos deste povo. Esses mesmos que saudaram Jesus entusiasticamente logo depois exigiram a sua morte. Isso acontece todos os dias. Todos os dias saúdam Jesus como Deus – mas como o “seu deus”, que vai resolver todos os seus problemas – e, se nós não pensarmos exatamente como eles, esse mesmo Jesus, segundo eles, nos manda para o quinto dos infernos.
Essa intolerância é a mesma que matou Jesus. Sejamos mais tolerantes.
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